NOTÍCIAS
Artigo – Estamos aqui
10 DE MARçO DE 2025
Nos últimos meses, as conversas, presenciais e digitais têm sido dominadas por um assunto: o filme Ainda Estou Aqui. Em linhas gerais, o filme narra a história da família Paiva e os horrores enfrentados durante a ditadura. Eunice Paiva protagoniza a saga familiar em busca de respostas e justiça pela prisão e desaparecimento de seu marido, Marcelo Rubens Paiva, que foi sequestrado, preso, torturado e morto.
O filme evidencia como a prisão e o “desaparecimento” – termo que coloco entre aspas por não se tratar de um desaparecimento propriamente dito – permeiam de maneira cruel a dinâmica dessa família ao longo dos anos.
Um dos pontos altos do filme – e da própria trajetória da Eunice Paiva – é o momento em que a viúva recebe, quase 25 anos após a prisão do marido, a certidão de óbito. No registro do óbito, encontra-se o elemento simbólico: diante da ausência do corpo, é o registro no livro que concretiza o fim.
O luto e sua vivência são questões trans-históricas, atravessam o tempo. Ainda na Grécia Antiga, no século V a.C., Sófocles narrava, em Antígona, a história de uma mulher que reivindicava o direito natural de enterrar seus mortos. Dois mil e quinhentos anos depois, como se o tempo não tivesse passado, Eunice Paiva e tantas outras mulheres continuam reivindicando do Estado o direito de velar e sepultar seus mortos.
Mais do que um direito hoje positivado, trata-se de uma marcação simbólica. Eunice, uma Antígona do mundo contemporâneo, exige justiça, insta que o Estado brasileiro reconheça a tortura, o sequestro e a ocultação de cadáver.
Segundo a psicanalista Maria Homem, aquilo que permanece inimputável, sem julgamento, nunca pode ser elaborado. E o que não pode ser elaborado retorna como repetição, como pulsão de morte, culminando na ideia de que se pode confiar no poder da força e na idealização de um passado que seria…
Aqui, permito-me um breve retorno ao direito positivado. A lei 9.140/95 reconhece como mortas as pessoas desaparecidas em razão de participação, ou acusação de participação, em atividades políticas. Nos termos do art. 3º da referida norma, o cônjuge, companheiro(a), descendente, ascendente ou colateral até o quarto grau pode requerer ao oficial de registro civil de seu domicílio a lavratura do assento de óbito. Recentemente, em 2024, o CNJ publicou a resolução 601, que dispõe sobre o dever de reconhecer e retificar os assentos de óbito de todas as pessoas mortas e desaparecidas vítimas da ditadura militar. Conforme a resolução, as lavraturas e retificações dos assentos de óbito devem ser baseadas nas informações constantes do Relatório Final da Comissão Nacional da Verdade, sistematizadas na declaração da CEMDP – Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, e direcionadas aos cartórios de registro civil.
Observe que, em ambas as normas, os pedidos são encaminhados para os ofícios de registro civil. Nesses casos, para além do múnus legal, o registro civil atua no campo simbólico.
A certidão de óbito representa um corpo e escancara o luto que tantas famílias não puderam vivenciar no tempo oportuno. O registro do óbito é o reconhecimento, pelo Estado brasileiro, da violência imposta a essas pessoas e a suas famílias. Eis a marcação simbólica abre caminho para não repetição.
Nós, registradores, representamos, com o fruto do nosso ofício, a concretização de direitos – inclusive o direito de enterrar os mortos.
E que possamos nos lembrar diariamente da nossa principal atividade: concretizar os direitos fundamentais. Estamos aqui!
Fonte: Migalhas
Outras Notícias
Anoreg RS
Em um mês, mais de 4 mil pessoas registraram em cartório desejo de doar órgãos
02 de maio de 2024
A cada lembrança da época em que enfrentou uma séria doença no coração, os olhos de Osmar Caetano dos Anjos,...
Anoreg RS
Registre-se: mutirão para emissão gratuita de Certidão de Nascimento acontece em maio em Porto Alegre
30 de abril de 2024
Porto Alegre receberá, em maio, mais uma Semana Nacional do Registro Civil – Registre-se!, mutirão voltado à...
Anoreg RS
Direitos Humanos promoverá semana nacional do registro civil em maio
30 de abril de 2024
Intitulada “Registre-se”, iniciativa vai assegurar documentação básica para povos originários, pessoas...
Anoreg RS
Audiência pública vai discutir penhora de imóvel alienado fiduciariamente em execução de dívida de condomínio
30 de abril de 2024
A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) convocou para o dia 3 de junho, às 14h, uma audiência...
Anoreg RS
Comissão aprova direito da pessoa com necessidade de curatela de opinar sobre curador
30 de abril de 2024
A Comissão de Desenvolvimento Econômico da Câmara dos Deputados aprovou proposta que inclui a pessoa que...